Viver aqui é como viver em qualquer lugar do país, tirando
que tem muita pouca gente para variar, e não tem cinema, nem grandes coisas da
arte, da ciência, da cultura, da civilização inteira... Também não há ofertas
de emprego, nem longas filas no trânsito, nem nas lojas em saldo, e cada vez
são menos, as lojas. De resto é igual, nem mais nem menos. Quem tem dinheiro
vive melhor em qualquer lado, mas também quem é feliz o pode ser, aqui como
noutro lugar, e quem não é não o será. Tirando as idiossincrasias e o mal estar
causado pelo inevitável aborrecimento do Esteves da tabacaria, que será talvez
sempre o mesmo, mas pode variar mais em qualquer sítio, aqui é um ponto do
tempo e do espaço onde estamos. Um ponto que faz parte de um país que se chama
Portugal. Um país pequeno, de resto, onde todos se podem encontrar mais
facilmente, mas vivem cada vez mais sós e sufocados pela existência. É um povo
com falta de ar. Esteve amordaçado demais e agora guarda as marcas da mordaça,
juntamente com muitos créditos bancários, que lhe roubaram a liberdade que
sonhou. Quando vem para a rua gritar, parece um arremedo de uma outra revolta,
dessa interior que guardará sempre, para os dias piores que inevitavelmente
espera. É que é pobre e tudo se acabou... Dizem então os sábios que só com a
sabedoria viverá melhor. Chama a isso o ignóbil nome de massa crítica.
Entenderei, porque quero entender bem, que será pasta passada do ponto... Não,
afinal referem-se ao cérebro humano. Aí, pelos vistos, residirá a arte de
enriquecer, como acontece em outros povos, como se tudo o que é a realidade do
indivíduo estivesse apenas dentro da sua cabeça. Isto vem a propósito de ter
ouvido que aqui, particularmente, não há essa coisa. Digamos, não há cérebro. Vamos
dizer que são as “elites intelectuais” que falham, para não embirrarmos mais.
Pergunta: e que elites tem o país que o orientem? Onde está o cérebro de
Portugal? Falando apenas deste lugar, o que lhe falta é um cérebro. Mas isso
significa que todos os que aqui estão não tenham massa? Crítica ou não. São incorpóreos?
(eleitoralmente sim, todos somos, porque todos somos pouca coisa) É a massa que
não tem consistência para se aglutinar? Não sei. A inteligência, acredito, é
muito adversa à “aglutinação”, em terras lusas. Mas é só um palpite. Devemos
ficar ofendidos, individualmente, por dizerem que praticamente “não existimos?”
A resposta do poeta é a minha, sim: “Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso
querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.” Bom
proveito vos faça a massa, e crítica, eu preferia tagliatelle servida quente,
nesta velha hora em que “todas as naus partiram!/ Na praia só um cabo morto e
uns restos de vela falam / De longe, das horas do Sul, de onde os nossos sonhos
tiram/ Aquela angústia de sonhar mais que até para si calam...”
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